domingo, 31 de outubro de 2010

Ensaios pós-namorísticos


Apresento hoje 3 ensaios de uma série com a temática "pós-namoro".

(Trilha sonora recomendada: Kid A - Radiohead e How to desapear completely - Radiohead)
 
[Sem titulo]

É uma tatuagem que deu errado, ou mais, membros amputados.
- É filho, a sua coluna não funciona mais, você sobreviverá, sem as pernas.
Você sabe das conseqüências.
O mundo segue. O céu ainda é azul, profundo e lindo, mas sua disposição de espírito falha.
É trágico.
Um animal ferido abandonado à intempérie.
É o nosso amor ferido e abandonado por nós.
Em breve será outro mês e depois outro ano, e pro mundo será como se ele jamais tivesse existido, e só nos restará uma mágoa, um sem-volta.
Caiu e rachou, nós escolhemos não juntar, não consertar.
O fim devia ser como uma bomba, algo irreversível, que acabasse com tudo, mas é uma dor que dura, e que volta, um remorso, angústia.
A agulha mais fina dói como a brasa mais quente.
Esqueço e sigo, mas sempre sou pego nesta armadilha metafísica dos meus sentimentos que é inquebrantável pela razão.



Saudades numa tarde

Assistindo um filme no pc. O celular chama. Pára o filme e vai atender. É só um amigo. Queria saber um número de telefone. Certo. Tchau. Deita-se na cama. O sol bate nas janelas fechadas. O som de um ônibus que passa lá fora, na esquina, anuncia que o mundo continua. O mundo não espera sua ferida curar. Pensa bem e vê que tudo vai estar bem de qualquer jeito. Se der e se não der, um jeito vai ter que se dar. Se não, tudo bem também. O jeito que for será um jeito, pois o jeito se dá. Assim ele tenta se consolar. Mas logo a coisa se repete: “Do jeito que ta, não da.”
Essa dor não é como uma chama: avassaladora. É como uma brasa, que queima sempre. Que dura. E dura. Arde. Quieta e silenciosa. Ele esquece da brasa, mas a brasa é só o que sobra quando o silêncio soa. Quando se encontra consigo mesmo, vê que o seu si esta enfermo.
Pensa nas coisas que divertem e nada é desejado. Está enfermo. Não quer remédio, não quer cachaça, não quer ver o amigo, não da bola pra moça que se engraça.
Tenta dormir, mas há travesseiros demais na cama e uma pessoa a menos.
Quando pensa e percebe que são lamentações pára: “Lamentações, que vergonha! Ou se age ou não se lamenta”. O dia já começou. Que que se vai fazer? A ausência dela é uma presença forte entre ele e a solidão. Entre ele e a multidão. Em qualquer lugar, tudo lembra. “Não vai ser bom” – ele pensa, “o que quer que aconteça”.
 

Um fantasma

Criei este fantasma aleijado e a dor dele é a minha. Ele me assombra, este espírito que vaga perdido, é como um filho que abandonei. Por mais que repita que não há culpados, que as coisas são assim mesmo, não parece certo, nem bom.
Não acaba com a vida, ela segue, mas, torna alguns momentos miseráveis. E o que se vai fazer?
Assombra-me o fantasma terrível de um amor que não teve jeito, um amor que insiste em existir mesmo que não funcione.


7 comentários:

  1. é assim mesmo, um dia agente sara!
    bju

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  2. Escrever não é um processo imparcial. Por mais que seja com o objetivo de contar uma história ou expressar um conceito, é um exercício onde tu resgata sensações e emoções tuas, portanto, acho que escrever sobre essas coisas deve ser bastante dolorido; não aconselho.
    Vambebê, cara!
    Hahahahahahahah

    Há um tempo atrás eu pensava que os indivíduos - e indivíduas - "underground" não amavam e não eram fofos, mas eles são. Muito massa isso... Além de ter que trabalhar pra sobreviver e viver sem saber de onde veio, o ser humano ainda depende extremamente de afeto... Quer castigo maior? Hahahahah

    Uma vez eu li uma história em quadrinhos onde os homens nasciam em caramujos e não havia sexo e nem atração entre homem e mulher. Achei o desenho fantástico e a idéia uma merda. Viva as mulheres e as injustiças que elas fazem conosco.

    Belos textos, cara. Gostei daquele do meio; nele "a dor parece doer" mais.

    Até!

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  3. [Eu entrei pelo link do blog do Tom.]
    O tempo parou pra mim, por um instante no texto do meio.
    Lindo demais. Assustadoramente lindo.

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  4. A Vida apresenta lições, meu amigo. Não era o senhor mesmo que estava por aí, um dia, com a expectativa de que seria feliz diante de qualquer adversidade? Ela te apresentou o outro lado.

    E Ela é assim, Ela é como Abraxás, Ela tem dois lados. Mas Ela vira, o mundo gira. Agora vocês está embaixo. E cria textos bonitos. Depois, estará em cima. Não se engane, sempre será vazio.

    E se compreenderes este vazio e o souberes contemplar, o universo vai te pertencer. Mas acho que já conversamos sobre isso.

    A propósito, "How to desapear completely" é realmente foda. Obrigado por esta indicação.

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  5. ninguém ama ninguém, e a idéia de solidão também é só uma idéia, amamos a idéia das pessoas e das relações que na realidade são falhas por que não depende de nós, só 50%

    pergunta pro tio freud

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  6. Pois dói mesmo. Acumulei uma porção de finais e ainda não sei lidar com isso.
    Bah, não sou boa com finais.
    Mas tu expressa teus finais como ninguém, Gustavo de Pelotas, vou te contar!

    Marina

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